domingo, 3 de outubro de 2010

Gestão de colecções e análise das necessidades da comunidade

A pergunta que em tempos idos (muito idos...) fiz a uma colega sobre quem decidia acerca da compra dos livros para as bibliotecas escolares, bem como a resposta obtida, estão na origem do facto de ter vindo a optar pela profissão de bibliotecário. 
A questão da constituição das colecções era já então para mim, intuitivamente, fulcral para o êxito ou fracasso de uma biblioteca. Até porque via no meu dia a dia de professor do ensino secundário que não havia na biblioteca escolar os livros e outros recursos que alunos e professores precisavam. Como eram eles adquiridos? Quem os escolhia? Que critérios eram seguidos? Ninguém me sabia dar a resposta.
Passaram mais de vinte anos e algumas coisas mudaram, mas o desinteresse (real, ainda que muitas vezes disfarçado) pela constituição e desenvolvimento das colecções continua a ser regra, com algumas poucas excepções. A Gestão de Colecções é uma disciplina essencial dos cursos de estudos de informação e de bibliotecas, mas tem infelizmente uma prática muito reduzida em Portugal. Uma simples busca no Google demonstra isto sem margens para dúvidas.
E contudo, o texto que se segue é retirado de um documento orientador básico, que nenhum bibliotecário desconhecerá. Aqui fica, para uma leitura atenta.

Análise das necessidades da comunidade
De modo a fornecer serviços que vão ao encontro das necessidades de toda a comunidade, a biblioteca pública tem em primeiro lugar de proceder à determinação dessas necessidades. Como as necessidades e as expectativas estão sujeitas a mudanças, este processo terá de ser repetido a intervalos regulares, provavelmente de cinco em cinco anos. Uma avaliação das necessidades de uma comunidade é um processo no qual a biblioteca recolhe informação pormenorizada sobre a comunidade local e as suas necessidades e serviços de biblioteca e de informação. O planeamento e o desenvolvimento de políticas baseiam-se no resultado desta avaliação, possibilitando assim a adequação dos serviços às necessidades. Em alguns países, a realização de um inquérito às necessidades de informação da comunidade é um requisito legal da autoridade local. A informação a ser recolhida incluirá:
·          dados sociodemográficos sobre a comunidade local, como por exemplo, o perfil etário e de sexo, a diversidade étnica e o nível educacional
·          dados sobre organizações na comunidade, como, por exemplo, instituições educativas, centros de saúde, hospitais, estabelecimentos prisionais, organizações voluntárias
·          informações sobre empresas e comércio na localidade
·          a área de captação da biblioteca, ou seja, onde os utilizadores da biblioteca vivem em relação às instalações da biblioteca
·          padrões de transporte na comunidade
·          serviços de informação fornecidos por outras organizações na comunidade
Esta não é uma lista exaustiva e seria necessária uma investigação mais aprofundada para determinar a informação necessária para avaliar as necessidades de informação da comunidade em cada situação. No entanto, o princípio da elaboração de um perfil da comunidade, permitindo ao bibliotecário e ao órgão da tutela planear o desenvolvimento e a promoção de serviços com base nas necessidades da comunidade, é importante seja qual for o contexto local. A avaliação deve ser complementada através de sondagens regulares aos utilizadores, com a finalidade de determinar quais os serviços de biblioteca e de informação pretendidos pelo público e a que nível, e a sua opinião sobre os serviços prestados. O trabalho de sondagem deve ser conduzido por especialistas e, para obter resultados mais objectivos, por uma organização externa, sempre que haja disponibilidade de recursos.

Os serviços da biblioteca pública : directrizes da IFLA/UNESCO (2001). 
[Lisboa] : Caminho, [2003].  (Caminho das bibliotecas & informação), pp. 107-108